Auschwitz-Bikernau – Uma Visita ao Campo de Concentração

Além de ser parte do currículo escolar em história, o holocausto é tema de diversos filmes, documentários e livros. Todos temos ideia do que aconteceu em campos de concentrações durante a Segunda Guerra Mundial. Mas colocar os pés no lugar e ver com seus próprios olhos as instalações fazem com que a história se encaixe de uma maneira inexplicável na sua mente.

Antes de contar minha experiência, vou ser bem sincera: a visita a um campo de concentração não é para todo mundo. Alguns setores podem ser chocantes e as histórias que os guias contam podem ser bem desagradáveis. Se você se considera sensível avalie bem suas condições emocionais e decida se é viável fazer esse tour ou não.

NA CRACÓVIA

O complexo de campos de Auschwitz fica a aproximadamente 1h30 da cidade de Cracóvia, na Polônia. Eu fiquei quatro dias lá e resolvi tirar um dia para ir aos campos. Existem diversas agências espalhadas pela cidade que oferecem o tour que inclui o transporte e o guia em inglês. Eu decidi pagar o tour porque estava interessada em ouvir os conhecimentos do guia e pela praticidade de já ter o transporte incluído.

Caso você decida fazer o tour sozinho, é possível chegar a Auschwitz de van e de trem a partir da Cracóvia. A cidade em questão se chama Oświęcim. A van é mais recomendada pois deixa bem na entrada do museu, enquanto a estação de trem fica a quase 2km de distância – o que significa uns 25 minutos de caminhada ou pegar ônibus local. A passagem das vans custa aproximadamente 12zł cada trecho e as que saem cedo lotam rápido.

A entrada para o museu sem guia é gratuita, mas confira as regras no seu planejamento porque existem alguns horários específicos para fazer a visita sem guia em alta temporada. É possível chegar lá sozinho e pagar por um guia ou se juntar a um grupo, mas também existem horários específicos para quem quer o tour em inglês ou espanhol.

São dois campos em questão para visitar: Auschwitz I e Bikernau, também conhecido como Auschwitz II. A distância entre os dois campos é de aproximadamente 3,5km. O museu oferece traslado em ônibus entre os dois campos da seguinte forma: entre Abril e Outubro, ônibus a cada 10 minutos. Entre Novembro e Março, ônibus a cada 30 minutos.

OBS: A 6km ainda existiu um terceiro campo importante, o de Monowitz (Auschwitz III). No total, o complexo de Auschwitz incluía mais de 40 sub-campos.

Mais informações: http://visit.auschwitz.org/

Recomendações:

  • Tempo de Visita –  o site oficial recomenda que você reserve no mínimo 3h30 para visitar os pontos principais de Auschwitz I e Auschwitz-Bikernau. Sim, é um grande complexo e talvez leve mais tempo que isso.
  • Alimentação – quando fechei o tour na Cracóvia, a atendente me orientou a levar meu próprio lanche pois as opções no local eram poucas. Eu cheguei a levar água e lanche mas só tomei água, porque fiquei sem fome o dia todo vendo aquelas coisas.
  • Respeito – lembre-se do local que você está visitando e o que ele representa. Se comporte com respeito em memória das milhares de pessoas que sofreram e morreram aqui. Use seu bom senso caso você queira tirar fotos nos lugares que são permitidos.

AUSCHWITZ I – “ARBEIT MACHT FREI” 

“O trabalho liberta” – esta frase foi colocada no portão de diversos campos de concentração, incluindo Auschwitz. Considerando o que houve nos campos, a sentença soa com uma imensa crueldade – diz a lenda que a idéia da mensagem era dizer que o trabalho árduo traz um tipo de libertação espiritual. Para mim a idéia é nada mais do que “trabalhe até não aguentar mais e se liberte através da morte”.

Por causa das prisões em massa, as penitenciárias locais na Polônia não tinham mais espaço. Assim nasceu o campo de Auschwitz, fundado em 1940 na cidade de Oswiecim, cidade que foi anexada ao Terceiro Reich pelos nazistas – que já vinham ativando campos de trabalhos forçados desde a década anterior.

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“O Trabalho Liberta” – Inscrição no portão de entrada de Auschwitz

A guia contou que como antigamente as notícias eram difíceis de confirmar, os nazistas divulgavam que Auschwitz era um lugar onde as pessoas poderiam trabalhar e começar uma nova vida. Os trens iam tão lotados de judeus indo aos campos, iludidos pela perspectiva de uma vida melhor, que muitas pessoas morriam no caminho por falta de ar – e talvez esses tenham dado sorte. Isso quer dizer que no começo os nazistas não precisaram se esforçar tanto em capturar as pessoas e levar ao campo de concentração. Neste primeiro campo, o número de prisioneiros flutuou entre 15 a 20 mil pessoas.

Ao sair do trem, as famílias eram separadas; Os incapacitados para o trabalho eram mortos: crianças muito pequenas, deficientes, idosos, doentes. As crianças gêmeas eram submetidas a estudos científicos nazistas – eles queriam conseguir produzir mais gêmeos.

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Apesar de o campo ter sido construído a princípio para receber prisioneiros poloneses, posteriormente recebeu também diversos outros tipos de pessoas. Cada prisioneiro era identificado com um símbolo no famoso uniforme listrado. As principais categorias eram:

Judeus – eram registrados em sua maioria como presos políticos. Inicialmente eram diferenciados de outros presos políticos por um triângulo amarelo no fundo e um triângulo invertido em vermelho, formando uma Estrela de Davi. Depois eles passaram a ser identificados com um triângulo vermelho e um pequeno retângulo amarelo acima do triângulo.

Presos Políticos – marcados com um triângulo vermelho, eles tinham alguns privilégios aprovados pela polícia alemã. Em sua maioria eram poloneses, tchecos, iugoslavos, ucranianos e russos. Havia uma minoria alemã e austríaca nessa categoria.

Criminosos – marcados com um triângulo verde, eram enviados para os campos após cometer algum crime ou após deixar a prisão em casos que a polícia decidiu que a sentença dada pelo tribunal era muito suave. Geralmente esses prisioneiros eram alemães.

Antissociais – marcados com um triângulo preto, eram levados aos campos de concentração por “vagabundagem ou prostituição” – na prática, por comportamentos não aprovados pelas autoridades alemãs. Os ciganos, por exemplo, eram identificados com o triângulo preto.

Testemunhas de Jeová – marcadas com um triângulo roxo, foram enviadas ao campo de concentração por sua neutralidade e posição pacífica, atitudes que no Terceiro Reich eram vistas como sendo contra o governo. Isso incluía a recusa em fazer a saudação “Heil, Hitler!” e se alistar no exército para a guerra. A maioria desses prisioneiros eram poloneses e alemães.

Homossexuais – marcados com um triângulo rosa com base na seção 175 do Código Penal Alemão. Esta categoria de prisioneiros era composta por alemães.

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Classificação de Prisioneiros

A classificação acima foi retirada de http://en.auschwitz.org/lekcja/1/

Auschwitz I é basicamente um complexo com pequenos prédios,  todos de concreto. Cada galpão está aberto hoje abrigando temas específicos. É triste ver o galpão com as milhares de fotos de pessoas que estiveram lá. É possível ver como eram os quartos e objetos pessoais dos prisioneiros. O que me chocou mesmo em Auschwitz I foram ver os tipos de celas construídas com requintes de crueldade. Eu mesma me senti sufocada só de olhar. Aqui também aprendemos que os judeus, antes de serem mortos, tinham que tirar os sapatos –  sapatos eram muito valiosos na época e aparentemente os judeus não mereciam ter aquilo.

Em Auschwitz I é possível ver também os locais onde as pessoas eram mortas por fuzilamento.

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Alojamento em Auschwitz I

BIKERNAU (AUSCHWITZ II)

Em 1941 as casas da vila de Brzezinka, a três quilômetros de Oswiecim foram confiscadas e demolidas para ceder espaço ao campo de Auschwitz Bikernau. Aqui o complexo é de grandes barracões de madeira – que aparentemente não protegiam nada do tempo frio. As ferramentas de exterminação em massa foram construídos aqui e a maioria das vítimas do holocausto foram mortas neste campo –  aproximadamente 90% das vítimas de Auschwitz, o que significa aproximadamente 1.1 milhão de pessoas. De cada 10 pessoas, 9 eram judeus.

Aqui dá pra sentir que o lugar é uma amostra grátis do inferno – condições precárias para viver e um campo de extermínio. O galpão dos “banheiros” por exemplo – umas bancadas também de madeira –  foi muito marcante para mim por causa de uma história que a guia contou: o trabalho de limpeza do tal banheiro era muito disputado pelos prisioneiros, porque os soldados nazistas sentiam repulsa do cheiro deles e mantinham distância.

Também vemos desenhos que crianças fizeram em suas camas. Uma tristeza só de imaginar uma criança em um lugar desses. A guia disse que a maioria das crianças que havia no campo eram filhos de poloneses. Os filhos dos judeus geralmente acabavam mortos.

O pior lugar para visitar em todo o museu com certeza é câmara de gás. Apesar de ser um lugar vazio, só de pisar você já sente um clima muito, muito pesado mesmo. Parece que o cheiro da morte ainda está impregnado nas paredes. Não dá para descrever em palavras. E o mais triste: na área externa existe um lago onde as cinzas das pessoas eram jogadas.

Todo esse terror teve um fim em 1945. Enquanto os prisioneiros eram evacuados, a SS tentou remover as evidências dos crimes cometidos nos campos. Eles destruíram alguns documentos, explodiram crematórios e barracões. O museu também mostra que eles tentaram sempre manter os registros no menor número possível e falsificaram documentos a fim de posteriormente negar os crimes ou minimizá-los. Um absurdo sem igual.

PORQUE VISITAR AUSCHWITZ

A visitação teve um grande impacto em mim por eu ser uma Testemunha de Jeová. Pensei que se eu tivesse nascido na Europa naquela época, eu poderia estar em Auschwitz ou em qualquer outro campo de concentração. Sinceramente, visitar uma vez só já basta. Não pretendo visitar nenhum outro campo novamente.

Mas também podemos pensar pelo outro lado: se um campo de concentração é símbolo do sofrimento, do holocausto e do genocídio, também é símbolo da resiliência humana. Ali temos a certeza de que  é possível sobreviver à mais terrível das condições. Que é possível manter a integridade apesar de maus tratos e ameaças. E que apesar das tentativas, uma pessoa tão má quanto Hitler não conseguiu exterminar os povos que ele considerou “inferiores”.

Uma frase estampada em Auschwitz diz: “Aqueles que não conseguem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo”. É uma citação do filósofo George Santayana que justifica a existência desse lugar tão sombrio, onde ocorreram tantas atrocidades contra seres humanos. Se a lição foi aprendida pela humanidade, precisaremos continuar a viver a história para confirmar. Se não foi, tenho certeza de que continuaremos a exercer a resiliência para sobreviver.

3 thoughts on “Auschwitz-Bikernau – Uma Visita ao Campo de Concentração

    • Carólis says:

      E aí Thiago! Tudo beleza e você?
      Como muitas pessoas começaram a me pedir dicas de viagens fiz o blog só pra facilitar a vida mesmo hahaha. Agora em vez de ficar repetindo as mesmas coisas toda hora eu só mando o link! Fique à vonts aí! Beijão

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